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Mostrando postagens de agosto, 2024

Perdido em Israel - Trecho 232

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  29 de agosto de 2024 Dilacerante foi a palavra que encontrei para descrever a carreata de familiares de reféns rumo aos limites de Gaza. Sequer consigo avaliar o desespero que toma conta de cada um deles – a maioria disposta a caminhar dentro do território em guerra para resgatar, com as próprias mãos, os reféns que ainda estejam vivos ou os restos mortais de seus entes queridos. Seria quase um ato de suicídio coletivo, mas significa uma tenacidade e um amor imenso de que foram privados no dia 7 de outubro, num ataque vil. Era só isso que eu queria dizer, em meio às notícias de sempre. Tenho a impressão de que a força dessa gente e das milhares de pessoas que a elas se aliaram vai mudar para sempre (e para melhor) o jeito de ser de um estado truculento e sem prioridades. Próximo trecho 233

Perdido em Israel - Trecho 231

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  28 de agosto de 2024 Veio para São Paulo, ontem, Jacqueline Ruperto, uma das minhas correspondentes em Israel. Tivemos um encontro emocionado em uma linda exposição de fotos de sua falecida mãe, a querida, saudosa e sempre enlouqucida Stefania Bril, ex-crítica de fotografia do Estadão, autora de diversos livros e amiga de longa data de meus pais, onde ambos tiveram casas de montanha em Campos do Jordão. Foi no Instituto Moreira Salles, em São Paulo, seguida de debates num auditório lotado. Fiquei muito impressionado com o prestígio de que Stefania ainda desfruta – a meu ver mais que merecido. Não via Jacquie há três décadas. Ela foi efusiva, lembramos de outros tempos e conheci seu marido Marc, um simpático e, pareceu-me, raso entendor do que se passa no país onde vive. Sua atitude, pelo que depreendi, é a de um torcedor de Israel. Tentei mais conteúdo, mas o ouvi dizer que “aposta que vai dar tudo certo”. Não mais. Já minha velha amiga envelheceu, como todos, mas segue aparentem...

perdido em Israel - Trecho 230

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26 de agosto de 2024 Com o noticiário incandescente das primeiras horas de ontem, pensei que a guerra no norte de Israel havia realmente estourado para valer. Lembrei-me, também de ter dito aqui que os iranianos usariam seus proxies para um mega ataque, de modo a permanecer na sombra. Nasrallah anunciou vingança, lançou um número indeterminado de mísseis, drones e foguetes russos katyusha (que significam pequena Katia, em homenagem à impiedosa czarina Catarina, a grande) e o mundo irrompeu em manchetes anunciando guerra total. Israel, informada sobre a ofensiva pelos seus serviços secretos, reagiu imediatamente, enviando cem jatos para – vejam só – apenas destruir os lançadores de mísseis do Hezbollah. E apanhando o resto no tal domo de aço. Cheguei a rabiscar algumas linhas sobre o caos que se seguiria. Lembrei-me, porém, de meu avô berlinense que sempre me dizia para dormir “sobre um tema”, antes de tomar decisões precipitadas – e resolvi fazê-lo. Eis que, como quase sempre, o velho ...

Perdido em Israel - Trecho 229

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24 de agosto de 2024 Alguma coisa desagradável deve ter acontecido em minha vida nesta data. Não tenho a menor ideia do que seja, mas a data me incomoda. Nesse dia, há 70 anos, Getulio Vargas, em suas palavras, “deixou a vida para entrar na História”. Há quem ainda cultue a lembrança do ditador, que, promoveu, sim, importantes avanços trabalhistas, mas que não teve nenhum remorso ao enviar Olga Benário (foto), judia, esposa de Luiz Carlos Prestes, seu rival político, para a Alemanha - onde ela havia nascido – e morreu rapidamente, gaseificada no campo de extermínio de Bernburg, aos 34 anos. Esse único fato fez de Getúlio um criminoso imperdoável – embora sua “capivara "seja extensa. E por que razão estou falando dele? Apenas pela efeméride. 24 de agosto, um dia que considero aziago e nem sei por que razão. Eu mesmo nasci no ano seguinte e levei anos para conhecer essa faceta do caudilho gaúcho. Ocorre que ditadores são ditadores – e isso é das piores coisas que sobrevive até hoje,...

Perdido em Israel - Trecho 228

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  23 agosto de 2024 Leio, anoto e deleto. Nenhuma notícia faz sentido nesse momento da guerra do Oriente Médio. Acordos, como tenho dito há meses, não saem, pois que dependem de concessões políticas e territoriais que parte alguma está disposta a fazer. Ou por outra: como disse recentemente, é fisicamente impossível misturar a água ao azeite, porque suas densidades são diferentes. Bombas? Um horror permanente e inútil, de que nenhum parte abre mão. Um rugido com vítimas que se repete há meses. O poder de persuasão de armas fortes é indiscutível em qualquer guerra. No caso específico, segue sendo apenas uma troca de “gentilezas” inconsequente. Assim como não há acordo em mesa alguma, todos relutam em mostrar até onde pretendem ir. Estou cansado daqueles surradas imagens de colunas de fumaça levantando a poeira dos desertos. A que se produz hoje é igual às demais, desde 7 de outubro do ano passado. A aritmética macabra de quem ou quantos morreram continua dando resultados vertiginosa...

Perdido em Israel - Trecho 227

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20 de agosto de 2024 Morreram todos os reféns? E seus restos mortais também não importam? Com uma espada afiada, Netanyahu anunciou, hoje, que não espera mais o retorno dos sequestrados em 7 de outubro. Não vai mais sequer se preocupar com o assunto. Os grupos, que vão se formar por todas as cidades, vilas, kibtuzim e moshavim de Israel depois da decapitação dos sonhos de milhares de parentes e amigos desconsolados (e, por vezes, descontrolados), devem fazer-se ouvir amanhã, serão urros de dor e ódio para sempre, porque não há como recolocar cabeças no lugar depois que elas se desatam dos corpos. A frase conclusiva veio assim. “Israel não vai pagar preço algum pela negociação de reféns. Nosso foco é conservar o que conquistamos em Gaza, mais do que fazer concessões para recuperar os que foram sequestrados.” Doces palavras de uma boca sempre amarga. Olhando pelo lado dos seres humanos que tiveram pais, filhos, netos, netas, sobrinhos e amigos seviciados, abduzidos (e, pior, sem que tive...

Perdido em Israel - Trecho 226

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Domingo, hoje, é um dia ensolarado aqui nas lonjuras do Brasil. Não há vento, o calor voltou e nada se ouve nas imediações, Dia de paradeira. O mesmo ocorre e vem ocorrendo em Israel. A posição errática do Irã diminuiu a tensão nacional, acho que já não há tanta gente olhando para o seu pedaço de céu local. As idas e voltas de um acordo sobre o qual nada se sabe, nem mesmo se é apenas logístico ou se levará à paz vão de lá para cá, têm pausas longas, como se não houvessem vítimas inocentes envolvidas. Tenho a sensação que a gerra, em todas as suas frentes, atingiu o limiar de exaustão e a permanecer como está ao menos não piora. Voltam todos à suas casinhas, Gaza já não é sombra do que foi e para novidade de ninguém, o ódio inter-religioso seguirá adiante por séculos e milênios. O azeite e a água seguirão não se misturando, mas a hipótese de que não precisa haver, ao mesmo tempo, água e azeite na mesma região, seguirá valendo. Seguimos, portanto, como estamos, nessa paradeira de um dom...

Perdido em Israel - Trecho 225

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15 de agosto de 2024 Um pouco mais sobre o Catar (ou Qatar). Trata-se de um pequeno apêndice da Arábia Saudita no golfo pérsico. Para lá e para o quase vizinho Bahrein afluem os abastados da região, em busca de prazeres secretos que outros país muçulmanos coibiriam. Tornou-se famoso ao patrocinar e adquirir times famosos de futebol da Europa e, supostamente, ao custo de bilhões de dólares, organizar uma Copa do Mundo de Futebol que, pelos padrões usuais, estaria fora de cogitação. Rico, diz-se que é o país mais afortunado do planeta. A revista Forbes, aliás, cravou essa posição. Ditadura monárquica, nada é feito, no país, sem a severa supervisão do emir Thamim bin Ahmad al-Thani, que desdenha do Congresso (que vive fechando). Com belas e exóticas construções derretendo numa das orlas mais quentes do mundo, vive do petróleo e dos arranjos bilionários que faz com investidores. O Catar não cobra impostos de ninguém, o que o torna sede de inúmeras corporações, Fontes dizem que o país tem c...

Perdido em Israel - Trecho 224

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13 de agosto de 2024 Uma amiga brasileira, radicada em Israel há mais de trinta anos, disse-me hoje que aplicou emplastros na nuca e na escápula. Produtos como esse devem estar vendendo com fartura desde que o Irã anunciou um ataque à Israel, como retaliação pela morte do antigo chefe político do Hamás, Ysmail Haniyeh. É uma mulher doce, sempre positiva, mas tem evitado, cada vez mais, a falar sobre a guerra. Em ato falho, no entanto, admitiu que ela e seus compatriotas têm passado tempo demais olhando para o céu, na vã tentativa de ver mísseis ou aviões sobre o céu do país onde mora. Não há como agir de outra maneira nesses dias de terror. Atenção aos olhos e aos ouvidos. Se você conhece o personagem Asterix, um herói gaulês resistente e bem-humorado, criado por Uderzo e Gocschiny, sabe, é claro que o único medo que possuem é de que os céus lhes caiam sobre as cabeças. Os israelenses estão assim. Hoje, mísseis arremessadas pelo Hamás – vindos, portanto, da faixa de Gaza quase produzir...

Perdido em Israel - Trecho 223

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12 de agosto de 2024 Larguei mão por três dias. Peço desculpas aos que me acompanham com assiduidade, mas as notícias voltaram a beirar o ridículo. Muita politicagem interna em Israel e muito medo de que Kamala Harris prevaleça nas eleições norte-americanas. Israel diz que é autossuficiente, capaz de lidar com qualquer problema, sem precisar da ajuda de ninguém. A julgar pelo noticiário a favor de Trump (que qualquer ser humano no domínio de sua inteligência sabe que é mentiroso, traidor e capaz de movimentos irresponsáveis para anunciá-los com sua empáfia habitual), os líderes israelenses só querem armas e mais armas e prestigiam quem está mais próximo da indústria que as produz e anda, como sempre, vicejante. Também se comenta, nos jornais hebraicos, temas locais corriqueiros, todos elevados à décima potência, dado o momento de patriotismo exacerbado. Sempre, durante esses meses de correspondência, é muito mais difícil extrair notícias dos grupos deliberadamente inimigos – o que arra...

Perdido em Israel - Trecho 222

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  8 de agosto de 2024 Será possível que uma guerra, nesse estágio de acontecimento e ameaças, torne-se tediosa? Maçante mesmo? Não há nada ocorrendo, nenhuma “breaking news” para interrromper os noticiários e isso é apenas inconveniente. Conviria se fosse um avanço rumo à paz. Mas como não, nem nunca houve, intenções pacíficas naquela parte do mundo desde o início dos tempos, tudo está chato e indefinido. Os reféns continuam em Gaza, mais e mais deles morrendo ou sendo descobertos sem vida. O Líbano segue esperando as atitudes do Hezbolá num silêncio de quem é incapaz de reagir. Há angústia em todas as capitais envolvidas, mas parece que a angústia alimenta essa gente, positiva ou negativamente. Enquanto isso, aqui mesmo em São Paulo, um painel pró-palestino ocupou a longa parede branca de um prédio. Como nada disso foi coibido, temos agora uma obra de arte antissemita a decorar a maior cidade da América latina. Será que suásticas (foto) também serão bem-vindas nos novos murais urb...

Perdido em Israel - Trecho 221

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  7 de agosto de 2024 Ontem recusei-me a publicar uma linha sequer. Se não houve nada em relação ao anunciado ataque iraniano, não houve nada mesmo. Só a rotina. Hoje preciso começar a entender o que está acontecendo. Vou começar pela pior das hipóteses: as forças iranianas economizam tempo para lançar um ataque devastador e preparam-se para um revide de alta intensidade. Começa a rediagramação do Oriente Médio e há a possibilidade de que tudo isso resulte numa nova ordem global. Hipótese intermediária: perante a pressão forte dos norte-americanos, que já mandaram navios de guerra para o Golfo Pérsico e, também, das bravatas (ou não) de Israel, que antes anunciou que uma único morte decorrente do ataque militar do Irã será vingada, imediatamente, com a destruição de todas as usinas nucleares do país dos aiatolás, o cenário teria mudado. O ataque seria pequeno, pouco letal, quase simbólico - o que, se não houver erros -, levaria Israel a uma resposta pouco relevante. A morte de Hani...

Perdido em Israel - Trecho 220

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  5 de agosto de 2024 Madrugada em Israel. Nada. Quero dizer: nada ainda. O Irã não desistiu, apenas deixou de aproveitar o triste feriado de Israel, ontem. Talvez alguma coisa tenha atrasado a operação. Descoordenação de mísseis, briga de aitolás. Vai saber. Todo mundo à espera do tamanho do prejuízo. Deve ser questão de horas, minutos. Não posso mais esperar, exceto pelo noticiário matutino. O caos pode não ocorrer. Mas – creio – às vezes vem assim mesmo. Lento, tenso, agoniante. A essa hora, eu mesmo decidi suspender minha vigília e conter meus mísseis. Sou um aitolá sem poder nem armada. Os outros, talvez, não o sejam. Próximo trecho 221

perdido em Israel - Trecho 219

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  4 de agosto de 2024 Ah: agora entendi porque tudo parece normal em Israel. A guerra já tem data. Começa amanhã, o que permite tomar sorvetes, ir à praia e comer falafels. É o que anunciam inúmeros informantes de diversas inteligências do mundo. Eu pergunto (e respondo que não, de minha parte) se você ira banhar-se no Mediterrâneo na véspera de uma tragédia anunciada? Guerras produzem sensações insensatas. E porque amanhã? Para os supersticiosos, a segunda-feira que se aproxima é um dia de luto e jejum em Israel. Trata-se do Tishá Beav, em lembrança da tomada, por inimigos, do Templo de Salomão, num antigo dia 9 de Av (mês do calendário judaico. Lembrança de uma grande derrota dos hebreus e de uma matança colossal (foto). Deve ser isso que fez os iranianos decidirem por iniciar seu ataque num dia azarado da história da Terra Santa. Vai que... Muitos ainda creem que o Irã, ameaçado também pelos norte-americanos, vai se acovardar e conduzir apenas um estrago simbólico – para poder c...

Perdido em Israel - Trecho 218

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  2 de agosto de 2024 Agosto é conhecido como o mês do desgosto ou do cachorro doido. Por algum motivo no passado, as mulheres de navegadores (sabe-se lá de onde) jamais marcavam seus casamentos para esse mês e a má fama ganhou fé pública. Está eternizada em nossa mitologia. O ataque do Irã a Israel, prestes a acontecer, já foi anunciado e pode levar a uma catástrofe de enormes proporções. E surpreendo-me, no noticiário dos maiores jornais do país com novas notícias de negociações em favor dos reféns. Mais atônito ainda, acompanho manchetes que celebram a medalha de prata conquistada pela judoca local Raz Hershko, derrotada por Beatriz Souza, a primeira medalhista de ouro do Brasil nos Jogos Olímpicos. Não me soa real. À espera do ataque, que pode vir a qualquer momento, é implausível que uma nação inteira pratique a pantomima da indiferença. Suponho que você, como eu, estaria, num momento desses, pronto e equipado para se abrigar no bunker mais próximo. As mães judias, famosas pel...

Perdido em Israel - Trecho 217

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  01 de agosto de 2024 Não tive de voltar a escrever ontem, porque, como já esperado, o dia foi de perplexidade, medo e ameaças. O aiatolá Khamenei já autorizou que suas forças ataquem Israel. Só faltou dizer o dia e a hora, porque crê que o elemento surpresa ainda possa fazer diferença. Mas – como é hora da verdade - as reservas já ficaram para trás. Sabe-se, agora, que Israel quis que Haniyeh morresse mesmo em Teerã, para exibir ao mundo de onde vêm as armas e recursos para tamanha bestialidade e para aguardar, sem medo (e com resposta adequada) a guerra que o Irã promete. O país sionista, aliás, informou que já havia plantado uma bomba no quarto onde o líder do Hamás dormiria - e há bastante tempo. Netanyahu admite que o país vai passar por um período de turbulências, pesadas até, mas está pronto para dar respostas exemplares, tanto para o Hezbolá, quanto para o Irã e o quase anencéfalo Hamás. As companhias aéreas internacionais já suspenderam seus voos para todas os aeroportos ...