Perdido em Israel - Trecho 92
A se notar:
A primeira delas é que se trata de um conflito sem interlocutores. Interlocução prevê o diálogo entre duas partes interessadas. Sempre é, a meu ver, o melhor caminho para qualquer tipo de solução. As pessoas se olham nos olhos – ou evitam olhar para seus interlocutores, o que é sempre parte de uma linguagem gestual, que põe palavras e ideias nos músculos, nos vasos sanguíneos ou nos nervos periféricos dos interlocutores.
A única chance de se entrever qualquer tipo de empatia entre forças rivais ocorre nesse momento. Se, mesmo que num deslize de alguma parte, os olhos se cruzarem e descobrirem um resquício de cumplicidade, novos caminhos abrem-se imediatamente. Se, ainda, surgir qualquer nova ideia, absurda ou criativa, que não tenha sido discutida e as partes vacilarem (uma piscada, um sorriso de olhos, uma centelha de dúvida), pode estar ali o caminho, ainda que seja apenas uma pequena senda que, com trabalho e mútuo sacrifício, pode tornar-se uma trilha no caminho da paz.
Eu adoro essa visão, porque, baseado em minha experiência, ninguém esconde nada de ninguém, quando frente a frente. Mas, infelizmente, esse não é o caso. Ontem mesmo, em Varsóvia, três interlocutores tiveram um encontro politicamente bizarro. Numa mesma sala, o presidente da CIA, o do Mossad e um a liderança do Catar tentaram resolver o insolúvel.
Não havia, como nunca há, um líder legítimo do Hamás, o tal interlocutor desaparecido. Aliás, nem se sabe quem é essa pessoa, onde vive, muito menos se busca qualquer tipo de acordo plausível, nem que seja uma pequena faísca retirada dos escombros de Gaza ou dos kibutzim atacados.
Pois, com todos os erros e reclamações de parte a parte, é nesse detalhe que a paz está mais bloqueada do que os moradores de Gaza. Nenhum reclamo é justo, nenhum argumento vale, enquanto não há interlocutores que se vejam olhos nos olhos.
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