Perdido em Israel - Trecho 27
Sétimo do interlúdio.
Pois é, naquele dia de março de 1968, fui informado de que pertencia a alguém ou alguma coisa. E isso é tão evidente quanto saber que um herói da Marvel foi criado pela Marvel e um da Disney foi criado pela Disney.
Houve um almoço chique, com centenas de judeus poloneses, na casa dos novos pais da vovó Krystyna, que, portanto, viraram meus avós. Ganhei mais presentes, mais beijos melecados de batom e mais Mazal Tóvs. Todos me olhavam – de verdade, eu juro – como se eu tivesse acabado de nascer.
De certa forma, foi isso mesmo o que aconteceu – o que só vim a saber depois que tive meus filhos e meus netos (que são vocês), frutos, em parte, dessa mesma macieira desconhecida.
Nunca me tornei religioso, mas ia, algumas vezes, à sinagoga, para honrar meus pais e antepassados, como vocês também já fizeram na minha companhia, na da Iéié e, que saudades, na do nosso papinha.
O almoço estava maravilhoso, como tudo o que cozinhava a Clara, a mão-de-ouro de minha avó Antonina. Afirmo – e essa será a única certeza dessa carta – que nunca houve uma cozinheira melhor do que a Clara, rainha dos doces, salgados, aperitivos e banquetes.
Que ninguém me desminta, porque vou ficar pau da vida.
À noite, a festa foi ainda maior: meu avô Ludwig e minha vovó Rosel tinham uma casa tão grande na rua Canadá, que os pisos eram ligados por um elevador! (Infelizmente, quando crianças, não podíamos usá-lo sem companhia de alguém mais velho).
A sala, enorme, foi alongada por um piso de madeira sobre o jardim, coberto de toldos. Vieram amigos da rua, alguns da escola (inclusive um crush que tive, menina bonita que, eu incluí entre os convidados e nunca me deu a menor bola). Judeus alemães aos montes. Tias, tios e primos, que sempre foram poucos.
Ganhei – sucesso das paradas – um microfone meia-boca, de som metálico que foi usado para diversos discursos, inclusive o meu mesmo.
De verdade? Não me lembro de nada do que foi dito.
Só dos sorrisos, abraços e lágrimas que, esses sim, me fizeram compreender: de algum jeito, eu estava entrando num novo mundo. Que era o mesmo, claro, mas que eu começava a entender de um jeito diferente.
Pois é, naquele dia de março de 1968, fui informado de que pertencia a alguém ou alguma coisa. E isso é tão evidente quanto saber que um herói da Marvel foi criado pela Marvel e um da Disney foi criado pela Disney.
Houve um almoço chique, com centenas de judeus poloneses, na casa dos novos pais da vovó Krystyna, que, portanto, viraram meus avós. Ganhei mais presentes, mais beijos melecados de batom e mais Mazal Tóvs. Todos me olhavam – de verdade, eu juro – como se eu tivesse acabado de nascer.
De certa forma, foi isso mesmo o que aconteceu – o que só vim a saber depois que tive meus filhos e meus netos (que são vocês), frutos, em parte, dessa mesma macieira desconhecida.
Nunca me tornei religioso, mas ia, algumas vezes, à sinagoga, para honrar meus pais e antepassados, como vocês também já fizeram na minha companhia, na da Iéié e, que saudades, na do nosso papinha.
O almoço estava maravilhoso, como tudo o que cozinhava a Clara, a mão-de-ouro de minha avó Antonina. Afirmo – e essa será a única certeza dessa carta – que nunca houve uma cozinheira melhor do que a Clara, rainha dos doces, salgados, aperitivos e banquetes.
Que ninguém me desminta, porque vou ficar pau da vida.
À noite, a festa foi ainda maior: meu avô Ludwig e minha vovó Rosel tinham uma casa tão grande na rua Canadá, que os pisos eram ligados por um elevador! (Infelizmente, quando crianças, não podíamos usá-lo sem companhia de alguém mais velho).
A sala, enorme, foi alongada por um piso de madeira sobre o jardim, coberto de toldos. Vieram amigos da rua, alguns da escola (inclusive um crush que tive, menina bonita que, eu incluí entre os convidados e nunca me deu a menor bola). Judeus alemães aos montes. Tias, tios e primos, que sempre foram poucos.
Ganhei – sucesso das paradas – um microfone meia-boca, de som metálico que foi usado para diversos discursos, inclusive o meu mesmo.
De verdade? Não me lembro de nada do que foi dito.
Só dos sorrisos, abraços e lágrimas que, esses sim, me fizeram compreender: de algum jeito, eu estava entrando num novo mundo. Que era o mesmo, claro, mas que eu começava a entender de um jeito diferente.
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