Perdido em Israel - Trecho 18

Mensagens saudosas e um monte de estrume.


Minha mãe, sobrevivente da guerra que resultara na partilha da Palestina, dava-me notícias triviais, conselhos que mães judias sempre oferecem e cobria-me de perguntas sobre o dia a dia em Israel. Tinha uma letra redonda e acolhedora que só os filhos compreendem e nunca deixava de me incentivar.

Guardei todas elas e, em correspondência, enviei-lhe também uma espécie de diário da jornada, com os mínimos detalhes (é o que ela me pedia) factuais e emocionais.
Andei vasculhando alguns baús e não encontrei nenhum dos volumosos manuscritos de minha estada. Seria ótimo reproduzir algumas delas (creio que foram mais de oitenta as que enviei e a mesma quantidade que recebi). Foi ali, de novo, que intui o jornalista e escritor que seria pelo resto da vida -, mas nunca o migrante que alguns sonharam, um refugiado sem vontade, longe do país em que nascera e onde nunca sentira (até então) o antissemitismo que assolou grande parte do mundo por séculos e séculos.
De vez em quando, havia, também, na correspondência, textos poéticos de meu pai, um fabuloso escritor quase inédito pelo dever de comerciar e sustentar a família.
Lembro, que entre os meus familiares, ninguém tivera tanto entusiasmo em recomendar aquela aventura repleta de desventuras. Ele mesmo, quando jovem, nos anos cinquenta, fez planos para se instalar em Israel. Projetos irremediável e oportunamente cessados pela fulminante paixão que desenvolveu por Krisia (diminutivo de Krystyna) que, em breve, se tornaria a minha mãe.
Acredito, contudo, que mais do que entusiasmo para a jornada, a amorosa correspondência trazia saudades do Brasil, ainda que um Brasil infectado pela ditadura, mas longe daquela Israel protegida por metralhadoras, para o qual eu não reservava qualquer empatia.
Fiz outros, muitos outros, trabalhos nos meses em que vivi no kibutz. Todos eles produziriam histórias divertidas e tristes desse relato. Só vou citar mais uma: fui encaminhado, em certa ocasião, para nova empreitada solitária que me soou agradável. Mas não seria...

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